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segunda-feira, 4 de novembro de 2019






OUTONO


Chegou o outono,
Casmurro, sorumbático,
Com aquele incontornável
Bafiento, soturno cheiro a morte.
Desculpem-me aqueles que o apreciam,
Mas, sinceramente,
Eu detesto-o,
Ou melhor, abomino-o!
Traz-me o desconfortável frio,
Leva-me o delicioso calor,
Congela-me, inclemente, a alma,
Num glaciar de infindável nostalgia.
Despe-me as árvores,
Desnuda-me a natureza…
E que lindas que elas estavam!
Como é triste aquele colorido de morte
Das folhas arrancadas pelo vento
Como pedaços de vida
À vida arrebatados,
Pairando, moribundas, no ar,
Num sonambulismo de morte,
Até jazerem, inertes, no chão,
Espezinhadas por tudo o que se move.
“Ah, mas são lindas,
Multicores,
Nas árvores ou no chão,
São telas magistrais,
Obras-primas, divinais,
Pura arte de geniais pintores,
Em seus inefáveis momentos de inspiração!”
Não! E não! E não!
Para mim são o prelúdio da morte,
O fim do ciclo da vida,
A não merecer sequer comiseração.
A inevitável corrida aos têxteis
Priva-me daquela feminina sensualidade
Que o impudico calor estival,
Generosamente me oferece.
Ah, que regalo para os olhos!
E que bálsamo para a alma!
Outono é prenúncio de inverno,
Daquele monótono cinzento,
Lutuoso, húmido e frio,
Em que busco um pouco de prazer
No sono embalado
Pelo monótono rufar da chuva
Sobre a impávida cobertura.
Hmm! Que bem me sinto no aconchego do lar,
Quando, lá fora, o temporal agreste
Açoita, impiedosamente, os viventes.
A natureza tinge-se de luto.
Silenciam-se as aves, os insetos,
Adia-se a vida,
Letárgica, preterida…
Não! Não gosto do outono
E, creiam, odeio o inverno.
A primavera é linda,
Sim, de acordo,
Não digo que não!
Renova-se a natureza,
Outros sons, outras cores,
Outro perfume, outra beleza,
Brilha o sol, aquece o chão…
Mas, pudesse o tempo,
A meu contento,
Ter uma só estação,
Essa seria, indubitavelmente,
O meu tão voluptuoso verão.


Ermesinde, 4 de novembro de 2019

Autor:
Miguel Henriques




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